quinta-feira, 31 de março de 2011

Primeiro sonho

Eu já havia andado a manhã toda e não podia fazer idéia de que horas eram ou se aguentaria o suficiente pra chegar em algum lugar. Até que avistei algo se movendo com a brisa no topo de uma duna não muito alta. Fiquei parada durante um tempo apenas olhando. Era um tecido meio preso na areia. Ele serpenteava para a esquerda lentamente. Quando subi até lá, pisei perto de onde ele estava e com o movimento do vento acabou se enrolando no meu tornozelo. Fui puxando de leve e eu vi que não era um lenço muito pequeno. Suas cores eras difusas e frias e sobressaía o dourado de uma linha cuidadosamente costurada fazendo desenhos sinuosos. Um bordado mais perfeito que qualquer máquina poderia fazer. O formato que se revelou quando o retirei totalmente do chão era retangular, com comprimento maior que o dos meus braços abertos. Passei-o entre as mãos para sentir a textura macia e o estendi para ver melhor o seu desenho.
Mas não era a única coisa que estava enterrada afinal, pois resolvi olhar novamente para o lugar de onde o tirei e vi um pontinho preto. Puxei para fora segurando pela tampa uma pequena garrafa de vidro vermelho com água. "Muito estratégico nesse momento", pensei.
Enfim, pude seguir tendo oque beber e como me proteger do sol.






À noite, a lua ficou radiante podendo ser vista longe das luzes citadinas e a Via Láctea estava livre de interferências tão ínfimas como as que criaram por aqui no planeta capazes de ofuscar a nossa visão. Com o lenço estendido eu me deitei e deixei a garrafa meio cheia do lado. Durante algum tempo observei as luzinhas no céu e de repente percebi muito contente que consegui distingui-las independente de lentes. Quando cheguei ao deserto estava desprovida dos óculos que enganavam minha miopia, mas felizmente também esta parecia ter sido deixada pra trás. Aos poucos as pálpebras cansadas caíram e o espetáculo cósmico foi fechado pelas cortinas do sono. A substituição por sua vez não foi tão agradável.
De um momento para o outro, eu andava pé ante pé em um fio de aço fino, alguns metros acima do chão, como em uma corda bamba, com o horizonte árido e brilhante ao meu redor, e um outro fio de aço transpassando meu corpo na altura do coração causando uma dor alucinógena que não vinha exatamente da perfuração. Eu ia segurando o fio de modo a facilitar a passagem pelo buraco no corpo e me lançava à frente com um impulso descabido para quem está sendo perfurado de um lado a outro, e na parte do fio atrás de mim as gotas vermelhas pendentes reluziam aos raios solares tingindo toda a corda metálica que parecia perder-se no horizonte presa ao infinito. O vento, por seu turno, apesar de mais acentuado, não era capaz de afetar o incrível equilíbrio instaurado naquela ação.
Acordei com a sensação do vazio na região do furo, e um sono ainda maior, como se ao cansaço do dia somasse o do ocorrido no sonho. Uma gota vermelha escorria manchando a roupa.

4 comentários:

  1. Acho que você escreve muito bem Érika, meu amor, no entanto acredito que tenta descrever demais o que passa, colocando muitos adjetivos que cansam um pouco a leitura, embora deixem-na mais bonita... acho que é um preço a pagar pela beleza de suas palavras, poderia tentar elucidar sua mente com mais sentimento e menos elogio as maravilhas que observa, transportaria mais rapidamente seus leitores a seu mundo magnífico... acho que é só..."Das mais de mil palavras que existem na nossa língua apenas 'amar' me faz te imaginar com a contemplação que eu daria as estrelas!"

    ResponderExcluir
  2. O último me chamou muito a atenção!
    A maneira como descreveu cada momento único sem a intervenção do tempo se localizou de forma metafísica.

    Cada post individualmente vibra de forma envolvente e me provoca a curiosidade e ansiedade de ler o próximo, mas com aquele sentimento de que não termine!

    Ótima Escritora!
    Beijos Kika.

    ResponderExcluir
  3. Esse post eu escrevi com uma certa sonolência, e acho que isso pode ter prejudicado ou ajudado na descrição dos momentos, depende do ponto de vista. Eu já estava entrando pela porta do sonho pouco antes de escrever esse capítulo. Talvez tenha sido isso que conferiu a sensação atemporal e a de excesso descritivo. Não sei.

    ResponderExcluir
  4. Como sempre, você me surpreende com seus textos!
    Gostei muito da maneira em que descreveu a paisagem. A mistura de sensações foi fascinante. Senti sede e saciei-me, senti também o tecido tocando minha pele.
    É fácil ver alegorias poéticas no texto, buscando interpretar seu universo interior. As cores contidas no texto, os símbolos e os significados ainda são muito misteriosos para mim.
    No final, há um toque de terror não esperado no início do texto. E as sensações mudam repentinamente. Não consegui interpretar seu sonho, mas o que ali, pra mim tem grande importancia, foi a continuidade de seu percurso transpassada.
    Ao final, onde está o limite entre o real e o imaginário?

    ResponderExcluir